Lia Marques: tradição e modernidade

Filha dos líderes do Grupo Paranga, a cantora, de 23 anos, lança seu primeiro álbum, com composições de Elpídio dos Santos e Zeca Baleiro

Por Danilo Casaletti

Lia Marques: família musical

Lia Marques: família musical (Foto: Rita Araújo/Divulgação)

Nome: Lia Marques
Idade: 23 anos
Pais: Negão dos Santos e Renata Marques
Cantor preferido: Ney Matogrosso
Cantora preferida: Cássia Eller
Compositor preferido: Elpídio dos Santos, Caetano Veloso e Milton Nascimento
Disco de cabeceira: Secos e Molhados
Música que gostaria de ter feito: O que será (À flor da pele), do Chico Buarque.
O que te motiva a seguir na música: o prazer em cantar, em estar em cima do palco e também a importância em levar em frente e divulgar a história musical da minha família.

A cantora Lia Marques herdou a ‘lojinha’ da família. No caso, a música. Neta de Elpídio dos Santos, músico da cidade de São Luiz do Paraitinga que se tornou uma grande referência da música do interior paulista, e filha de Negão dos Santos e Renata Marques, do Grupo Paranga, Lia começou a cantar cedo, ainda na adolescência. Cantou em bailes e carnavais de sua cidade, famosa pelas marchinhas.

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Em março de 2013, Lia lançou seu primeiro álbum, Se perfume tivesse cor, a rosa seria beija-flor. O nome do disco foi pinçado dos versos da canção Perfume não ter cor, feita por Marco Rio Branco, compositor de São Luiz do Paraitinga que assina outras seis músicas do disco. “O Marco quebra a visão de muita gente que acha que São Luiz tem só música caipira e marchinha”, diz Lia, ao justificar a preferência.

Essa é justamente a proposta do álbum: mostrar a música tradicional, a qual Lia ouve desde muito pequena, mas com uma linguagem moderna. Para essa tarefa, Lia contou com a ajuda do pai, Negão dos Santos, que assina a direção musical do disco.”Temos uma forte ligação e só com o olhar já conseguimos nos comunicar”, conta Lia. Confira a entrevista com a cantora.

Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista – Você nasceu em uma família bastante musical. Quando, de fato, descobriu que também queria seguir por esse caminho?
Lia Marques – A música sempre foi a respiração da minha família e isso vem muito antes de eu nascer. Meu bisavô era maestro, meu avô compositor (Elpídio dos Santos), meus pais e tios músicos. Brincar com os primos, encontrar a família era sempre com música, nos ensaios do Paranga. Quando pequena minha impressão era que eu ser cantora era algo “óbvio”. Se todo mundo era, eu também iria ser (risos). Assim como acontece com família de comerciantes, que a loja era do pai, que era do avô, que era do bisavô e assim por diante. Claro que o lugar em que vivo contribuiu muito para isso. Era fácil montar uma banda com amigos e usar os equipamentos de casa para ensaiar, os festivais de São Luiz do Paraitinga que sempre me chamavam para participar. E, quando me dei conta, estava eu, com 14 anos, fazendo minhas primeiras apresentações com o Paranga.

LPVP – São Luís tem muita tradição musical, principalmente com as marchinhas. Você também é ligada ao gênero?
Lia – São Luiz sempre foi conhecida pela tradição musical, antes mesmo da marchinha despontar com o retorno do carnaval, em 1981. Sinto-me muito ligada ao gênero e não poderia ser diferente. Cresci pulando carnaval de marchinha e participando dos festivais. Tive a oportunidade de interpretar “Pelas costas tudo bem”, composição do Arnaldo Antunes, Marcelo Jeneci e Betão Aguiar. Canto marchinhas no carnaval de São Luiz nos shows do Paranga e em blocos.

LPVP – Seu pai foi diretor musical do CD. Achou importante ter essa ligação familiar no CD?
Lia – Para mim é um privilégio ter em casa uma figura tão talentosa como o Negão que, além de ser ótimo músico, cria arranjos que transformam as canções. Como somos pai e filha e trabalhamos há muito tempo juntos, temos uma forte ligação e só com o olhar já conseguimos nos comunicar (risos). Eu conheço as fontes musicais que ele bebeu, ele sabe os sons que tenho curtido e assim foi bem fácil construir o disco e chegar a um resultado que tivesse a minha cara.

LPVP – No CD você alia tradição, as suas raízes, com a música moderna. Como encontrou esse equilíbrio?
Lia – Negão dos Santos sempre fez esse trabalho de atualização. Não adianta abrir a pasta de músicas do Elpídio e tocá-las como estão na partitura. As pessoas não vão se identificar. Com novos arranjos, elas ganham uma roupagem para serem mostradas ao público. No meu disco também foi assim. Algumas das canções que escolhi foram feitas antes de eu nascer, como “Só esperança ficou”, que é de 1960. Minhas próprias influências, os elementos que queria inserir no CD, tornaram as músicas mais modernas.

Lia ao lado de Zeca Baleiro e Negão dos Santos

Lia ao lado de Zeca Baleiro e Negão dos Santos

LPVP – O CD traz uma parceria do seu pai com o Zeca Baleiro (Parece filme), que é um grande admirador da turma do Lira Paulistana. Como aconteceu essa aproximação do Zeca com vocês?
Lia – Há muitos anos ele foi ser jurado em um Festival de Marchinhas de São Luiz e um conhecido em comum o levou para a casa da Vó Nira. A família toda se reuniu na cozinha tocando e cantando, mostrando as coisas do Vô Elpídio. Descobrimos que ele já conhecia o trabalho do Paranga da época do Lira. No fim da noite, meu pai foi se despedir, contou sobre alguns projetos sobre o Vô e o Zeca disse :“tô dentro!”. Em 2009, ele participou do DVD “Tributo a Elpídio dos Santos” e o laço foi só se fortalecendo, até essa parceria dele com o Negão.

LPVP – A maioria das canções do seu álbum é do compositor Marco Rio Branco. Por que essa identificação com a obra dele?
Lia – O Marco quebra a visão de muita gente que acha que São Luiz do Paraitinga tem só música caipira e marchinha. São Luiz já tem os representantes da música raiz e carnavalesca, que gosto muito e também trabalho, mas eu quis fazer um disco com canções que não se prendem a um gênero, que tem abertura para misturar diversos elementos e isso é Marco Rio Branco. Ele também é da família, primo do meu pai, chegou a participar do Paranga logo que o grupo foi criado, e é compositor de várias canções do “Chora viola, canta coração”, disco lançado pelo selo do Lira.

Ouça o CD de Lia Marques

LPVP – Você mesma colocou seu CD completo no YouTube. Como avaliada a ferramenta? O canal é um bom aliado do artista?
Lia – Tudo tem seu lado bom e seu lado ruim. Disponibilizar o disco completo na internet faz com que menos pessoas comprem o CD físico, porém é mais fácil chegar aos ouvidos de pessoas que, de repente, não teriam contato com meu trabalho. Antes de disponibilizar o CD completo online, fiz uma brincadeira e enviei as músicas para todos os interessados em conhece-lo que estivessem fora do Brasil. As pessoas ouviam e fotografavam a capa do disco onde estavam. Recebi fotos da França, Estados Unidos, Austrália, Espanha e isso só foi possível pela existência da internet.