Danilo Moraes: música e alegria

Filho de Wandi Doratiotto, do grupo Premê, Danilo Moraes é reconhecido com um dos grandes compositores da nova geração

Por Danilo Casaletti

Danilo Moraes: "Quando eu tinha 16 anos, fui tocar com o Premê e vi que eles se divertiam muito trabalhando"

Danilo Moraes: “Quando eu tinha 16 anos, fui tocar com o Premê e vi que eles se divertiam muito trabalhando”

Nome: Danilo Moraes Doratiotto
Idade: 34
Pais: Wandi Doratiotto e Mara Moraes Doratiotto
Cantor preferido: Jackson do Pandeiro, sem dúvida
Cantora preferida: Elis Regina
Compositor preferido: Dominguinhos
Disco de cabeceira: Coisas, do Moacir Santos (1965), Kind of Blue, do Miles Davis (1959) e Elis& Tom (1974)
Música que gostaria de ter feito: Último desejo, do Noel Rosa
O que te motiva a seguir na música: Certamente não é a grana que eu ganho (risos). Eu não saberia viver diferentemente. Mas, talvez, até poderia tentar trabalhar com outra coisa para poder fazer a música só com o amor que sinto por ela. Poder não viver de música, não pegar um instrumento por obrigação.

Doratiotto. D-o-r-a-t-i-o-t-t-o. Danilo, filho do músico, cantor, compositor e ator Wandi Doratiotto  – o líder da banda Premê – cansou ver seu pai soletrar o sobrenome em entrevistas. Em vão. Sempre escreviam errado. Por isso, optou por um nome artístico mais simples: Danilo Moraes. Isso, claro, não aponta para qualquer negação do pai famoso. E nem poderia. Danilo, hoje com 34 anos, foi criado em meio aos ensaios e shows do grupo Premê. Foi assim que se descobriu artista e aprendeu que a música pode ser feita com muita alegria.

Cantor, compositor e guitarrista, Danilo começou sua carreira na década de 90, participando de festivais de música. O destaque veio  no ano 2000, quando compôs, ao lado de Ricardo Teté e Rodrigo Castilho – parceiros constantes em sua carreira -, o xote Beijo Roubado. Gravada pela banda Rastapé, a música virou sucesso nacional e fez com que Danilo passasse a se dedicar ao forró. Nessa época, gravou o disco Na pista, ao lado da banda Banguela.

Com a palavra, os pais:

Em 2004,  Danilo foi passar uma temporada na França. Lá, mesmo aberto para novos sons, descobriu que gostava mesmo era de fazer música brasileira. “Tudo o que faço tem sotaque brasileiro. Não é algo do tipo plumas e paetês, mas com a essência brasileira”, diz. Ainda na Europa, gravou o álbum 51, ao lado de Teté.

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De volta ao Brasil, em 2006, foi o vencedor do Festival de Música da TV Cultura com a canção Contabilidade. A vitória  quase se perdeu em meio à retumbante vaia que recebeu da plateia (o pai de Danilo, Wandi, era um dos apresentadores do festival). Porém, em seguida, ficou em segundo lugar no Prêmio Visa.

Gravado por nomes como Céu e Anelis Assumpção, Danilo lançou seu mais recente trabalho em 2011, Danilo Moraes e os Criados Mudos, ao lado dos músicos Zé Nigro e Guilherme Kastrup.

Em entrevista para o site Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista, Danilo Moraes falou sobre a sua formação musical, sobre o compositor Jackson do Pandeiro, a quem atualmente dedica um show, e a respeito do documentário que faz sobre a história do grupo Premê. “Eles podiam fazer de tudo. E faziam bem”, diz, sobre a banda que conhece muito bem. 

Lira Paulistana e a Vanguarda Paulista – Você conviveu com a música desde muito cedo, com seu pai e, provavelmente, com os demais músicos do Premê, além de outros artistas. Isso foi determinante para você também seguir o caminho da música?
Danilo Moraes – Totalmente determinante. O Premê foi a primeira e a maior referência da minha vida. Quando eu era pequeno, meus pais não tinham onde me deixar, então, eu ia sempre aos shows do grupo. Gostava muito de ver os instrumentos todos no palco. Olhava e ficava fissurado, queria tocar todos – que não eram poucos. Alguns deles eu aprendi a tocar. E, desde cedo, meu pai me ensinou a ter respeito pelos instrumentos, ter uma relação bacana com eles, não ficar fuçando. Também aprendi com o pessoal do Premê a coisa do trabalho ser divertido. Quando eu tinha 16 anos, fui tocar com o Premê e vi que eles se divertiam muito trabalhando. Cada ideia que tinham, rolavam no chão de rir. Todo muito deu muita risada com o Premê, mas tenho certeza que foram eles que mais riram de si mesmos. 

LPVP – No início da carreira, você tocou bastante forró em casas noturnas de São Paulo e, atualmente, tem um projeto para apresentar as canções de Jackson do Pandeiro às novas gerações. Quando nasceu esse interesse pelo gênero?
Danilo – Eu sempre ouvi muito Jackson em casa. Meus pais tinham os discos dele e eu sempre gostei. Adorava a alegria, o ritmo dele. Sempre admirei o jeito com o qual o Jackson tirava uma onda, sempre com muita qualidade, muito conteúdo. Tudo muito sofisticado melodicamente. Fala-se muito do ritmo do Jackson, mas pouco das melodias dele, de quanto ele era um cantor completo, da afinação As melodias que ele fez são muito difíceis de cantar. Sempre as estudei muito. Tem músicas dele que eu ouço desde criança e ainda não me sinto maduro para cantar. Nesse show que faço agora com as canções do Jackson, o Forró Quentinho, eu vou ao limite do meu conhecimento musical, da minha técnica. Eu uso a guitarra para fazer riffs melódicos, contracantos. 

Danilo com o pai, Wandi Doratiotto: unidos pelo amor à música

Danilo com o pai, Wandi Doratiotto: unidos pelo amor à música

LVPV – Você passou um tempo morando na França. Com qual tipo de música você teve contato lá? Seu trabalho se modificou ou sofreu influência por conta disso?
Danilo – Eu toquei muita música brasileira lá. Eu até queria tocar outras coisas, mas lá nós somos vistos como brazucas. Eles queriam ouvir música brasileira. Não queriam que eu tocasse rock, isso tem na Inglaterra, nos Estados Unidos, e eles não têm muito interesse em ouvir. Mas a experiência serviu para eu ver o quanto gosto da música do meu país. Eu achava que todos os países tinham uma música boa, de qualidade. Mas não é verdade. A música brasileira é muito sofisticada, é f… mesmo. Eu voltei de lá querendo fazer mais música brasileira ainda. Tudo o que faço tem sotaque brasileiro. Não é algo do tipo plumas e paetês, mas com a essência brasileira. Um rock com algo do samba, do forró, por exemplo. Quero sempre ter uma identidade brasileira na minha música. E essa vontade se solidificou lá na França.

LPPV – Em 2007, você e o Ricardo Teté ganharam o prêmio (e a vaia) no Festival da TV Cultura com a canção “Contabilidade”. Valeu à pena a exposição?
Danilo – Valeu à pena. Como prêmio, eu e o Teté ganhamos a gravação do nosso disco, a A Torcida Grita. Esse é um álbum do qual eu gosto muito. Pudemos fazer uma produção bacana, tocar com músicos que eu sempre admirei. Na verdade, as vaias aconteceram porque TV Cultura acabou se embananando com a organização. Meu pai foi escalado para ser um dos apresentadores depois que a gente já estava selecionado para o festival. Por conta disso, muita gente não gostou ou desconfiou do resultado. No ano seguinte, eu peguei o segundo no Prêmio Visa e isso foi bacana para consolidar meu trabalho, para não ficar essa dúvida no ar. Foi muito chato as pessoas desconfiarem da minha seriedade. O júri era altamente qualificado para escolher e a gente mereceu, não sei se o primeiro lugar, mas a música mereceu ser premiada.

LPVP – Os festivais de música são o melhor caminho para os novos compositores?
Danilo – Não acho. Acredito que a competição não seja o melhor caminho. Cada um gosta de uma coisa. Não existe um primeiro lugar que seja consensual. Mas, hoje em dia, está muito difícil mostrar um trabalho. A internet também não me parece um meio ideal. Ajuda um pouco, mas banaliza. Todo mundo está lá se promovendo. Fica algo meio falso. Você tem um monte de curtidas no Facebook, mas quantas pessoas vão ao seu show? No Lira, as pessoas iam assistir aos shows, saíam de casa para isso. Não era nada virtual, a música não caía no colo das pessoas, elas é que iam atrás do que estava acontecendo. Faltam espaços como o Lira. Até tem alguns, mas eles chamam os artistas independentes no início, porém, quando o lugar fica famoso, vira uma panelinha, só essas pessoas tocam lá, não chamam outros artistas novos.

LPVP – No seu projeto com o grupo Criados Mudos tem pelo menos duas músicas que falam sobre o cotidiano de São Paulo, que citam bairros paulistanos (No cume da Lapa e Na volta do Pari). Você também fez uma música sobre os recentes protestos de rua. Essa veia de cronista da cidade vem de uma influência do Premê?
Danilo – Não sei se só do Premê. Tenho outras influências. O Rodrigo Campos, que é meu parceiro em Na volta do Pari, é um campeão em fazer crônicas da cidade, de falar dos bairros. O Teté também foi trazendo o humor para as letras. No começo da minha carreira, como o meu pai tinha essa coisa muito forte do humor no trabalho dele, eu quis ir para outro lado, fazer música mais séria. Mas cansei um pouco de ouvir música de amor. Todo mundo sofre e é feliz no amor, mas já tem muita música sobre isso. Nas crônicas muita gente se identifica também. Tem os personagens, as paisagens da cidade.

LPVP- Você está fazendo um documentário sobre o Premê. O que descobriu de mais interessante sobre o grupo? Na sua opinião, qual a importância do Premê e da turma que passou pelo Lira para a música popular brasileira?
Danilo – Estou fazendo o documentário junto com o diretor Alexandre Sorriso. Sempre participei muito do Premê e meu pai dividia muita coisa sobre o grupo em casa. Por isso, sei muito da trajetória deles. O Premê foi um dos poucos grupos da Vanguarda que tocou nas rádios, com São Paulo, São Paulo. Depois, foram para uma gravadora grande (EMI), e isso gerou um conflito com a estética do grupo: uma banda alternativa, paulista, de repente estava em uma major, no Rio de Janeiro, dentro do esquema. Talvez isso tenha enfraquecido um pouco a característica inicial do grupo. Mas, ao mesmo tempo, trouxe um monte de coisas bacanas para eles. Assim como todos da Vanguarda, ou da primeira geração que passou pelo Lira, o Premê era muito sofisticado. Fazia a fusão da música erudita com a popular. Tinha rock, tinha música conceitual, boas letras, performances, humor. Eles podiam fazer tudo. E faziam bem. O Itamar era outro cara muito sofisticado. Um gênio mesmo. Merecia ser um popstar. Mas, para a média do público, isso era estranho, infelizmente.